sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A coisa mais injusta sobre a vida é a maneira como ela termina.


Eu acho que o verdadeiro ciclo da vida está todo de trás pra frente. Nós deveríamos morrer primeiro, nos livrar logo disso.

Daí viver num asilo, até ser chutado pra fora de lá por estar muito novo. Ganhar um relógio de ouro e ir trabalhar. Então você trabalha 40 anos até ficar novo o bastante pra poder aproveitar sua aposentadoria. Aí você curte tudo, bebe bastante álcool, faz festas e se prepara para a faculdade.

Você vai para colégio, tem várias namoradas, vira criança, não tem nenhuma responsabilidade, se torna um bebezinho de colo, volta pro útero da mãe, passa seus últimos nove meses de vida flutuando. E termina tudo com um ótimo orgasmo! Não seria perfeito?

sábado, 23 de outubro de 2010

Obrigado, Minha Terra - Poesia de Oliveira Silveira


Obrigado rios de São Pedro
pelo peso da água em meu remo.
Feitorias do linho-cânhamo
obrigado pelos lanhos.
Obrigado loiro trigo
pelo contraste comigo.
Obrigado lavoura
pelas vergas no meu couro.
Obrigado charqueadas
por minhas feridas salgadas.
Te agradeço Rio Grande
o doce e o amargo
pelos quais te fiz meu pago
e as fronteiras fraternas
por onde busquei outras terras.
Agradeço teu peso em meus ombros
músculos braços e lombo.
Por ser linha de frente no perigo
lanceando teus inimigos.
Muito obrigado pelo ditado
“negro em posição é encrenca no galpão”.
Obrigado pelo preconceito
com que até hoje me aceitas.
Muito obrigado pela cor do emprego
que não me dás porque sou negro.
E pelo torto direito
de te nomear pelos defeitos.
Tens o lado bom também
- terra natal sempre tem.
Agradeço de todo o coração
e sem nenhum perdão.
(Pêlo escuro, 1977)
 
Fotografia de Pierre Verger.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

A verdadeira arte de viajar...


A gente sempre deve sair à rua como quem foge de casa,
Como se estivessem abertos diante de nós todos os caminhos do mundo.
Não importa que os compromissos, as obrigações, estejam ali...
Chegamos de muito longe, de alma aberta e o coração cantando!
Mário Quintana.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

No te Salves


No te quedes inmóvil
al borde del camino
no congeles el júbilo
no quieras con desgana
no te salves ahora
ni nunca
no te salves
no te llenes de calma

no reserves del mundo
sólo un rincón tranquilo
no dejes caer los párpados
pesados como juicios

no te quedes sin labios
no te duermas sin sueño
no te pienses sin sangre
no te juzgues sin tiempo

pero si
pese a todo
no puedes evitarlo
y congelas el júbilo
y quieres con desgana
y te salvas ahora
y te llenas de calma
y reservas del mundo
sólo un rincón tranquilo
y dejas caer los párpados
pesados como juicios
y te secas sin labios
y te duermes sin sueño
y te piensas sin sangre
y te juzgas sin tiempo
y te quedas inmóvil
al borde del camino
y te salvas
entonces
no te quedes conmigo.

* Mario Benedetti

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Durante a nossa vida


Conhecemos pessoas que vem e que ficam,
Outras que, vem e passam.
Existem aquelas que,
Vem, ficam e depois de algum tempo se vão.
Mas existem aquelas que vem e se vão com uma enorme vontade de ficar...
* Charles Chaplin

Créditos da imagem: Tatidraws Ilustrações

Coisas que perdi


E não há um porão em minha casa,
(quem sabe lá eu encontrasse?)
Uma porção de coisas que perdi
os índios, a cavalaria, o poema que não fiz.
E a moça da motocicleta, e dos barquinhos de papel,
Quem sabe lá eu encontrasse, uma casa e um porão...

* Poema de Miguel Dias. Agó.

Créditos da Imagem: Tatidraws Ilustrações

Partitura do Amanhecer


                                                                                                                             Por Carlos Rizzon.

domingo, 17 de outubro de 2010

Pequena História do Beco e da Avenida



Como poderíamos dar certo?
Tu és avenida.
Eu, o beco
Tu tens os olhos de neón
Os meus são meras lamparinas.
Teus cabelos de fios alinhados,
Os meus, um emaranhado,
                uma gambiarra.

Tua pele lisa e linda,
Negro asfalto que brilha.
Eu, de pele manchada e esburacada.
Tu de nome pomposo:
Angélica, Paulista, Consolação...
Eu, beco da Traição, da Mãe Chica e o Escambau.

Recebes presidentes, ilustres e patrões
Eu, bichas, putas e ladrões.
Tu tens shoppings de quarteirão
Já eu, bodegas de montão
Tu exibes a beleza que fascina
Eu, a pobreza que incrimina.

Ocultas tua verdadeira face
Vil, mesquinha e hipócrita
Tudo que eu condeno.
Faço da pobreza meu sangue
Da feia face, minha bela bandeira
E dos miseráveis, meu exército.

Enquanto tu és previsível
Eu tenho em minhas vielas e esquinas
                                         a surpresa.

O beijo inesperado
De um travesti com um socialite
Na ladeira, um encontro de um cafetão
Com uma de suas damas que vem nos abusar

Temos ainda à beira de um casebre
A luz de um amor sincero
E no respladecer do dia a beleza de duas fantasias
Jogadas sobre a janela de um barraco qualquer

Quem diria, não são fantasias
São Pierrot e Colombina.

* Mais uma do Valter Di Lascio. Bis Coito Com Champagne.
                                                 

O Mundo é Cinza

Conheci o poeta Valter Di Lascio na capital do Ceará, Fortaleza, em 2002. Com a roupa suja e a barba larga, oferecia seus poemas em uma galeria no centro da cidade, ao preço de 3 reais o livreto.
Antes de encontrá-lo, havia lido uma poesia sua em um Zine que circulava no meio acadêmico da UFC. Chamava-se O Mundo é Cinza, e logo abaixo dizia Poema de Valter Di Lascio, contatos ao acaso.
Eis que, ao acaso, Valter estava à minha frente.
Comprei o impresso chamado Bis Coito com Champagne, que tinha, já, várias edições. Nele, encontrei algumas pérolas. Valter vivia na rua e trocava suas palavras pelo dinheiro da cachaça, dos cigarros, das dores e prazeres mundanos. Convivemos muito no ano em que andei pela Terra do Sol, pois ele circulava em vários cenários, desde recantos suburbanos da capital à Festivais de Teatro, Bienal do Livro, Centro Cultural Dragão do Mar. Tenho notícias de que até hoje está por lá.
Chovia quando nos conhecemos, e as palavras que escreveu como dedicatória no verso de sua lembrança, que trago com carinho, foram as seguintes: Sejamos persistentes como o sol que neste momento nos brinda com o seu calor, e enxuga as nossas vestes marcadas pela D. Chuva. 
Um brado pela poesia de calçada. Transcrevo, à seguir, alguns de seus versos.

A LUA EM PRETO E BRANCO

Minha poesia é em preto e branco.
Suja e mal cheirosa,
Capaz de fazer corar
O mais vil dos mortais.
Dizer que o vinho
Quanto mais velho, é melhor,
É perigoso
Cuidado!
Pode estar azedo
Toda verdade se encerra
Nela mesma, e,
Diante da
Lua cheia
Toda farsa torna-se
Verdade.

SONONHOS

Tu controlas teu
                    semelhante
Tu controlas teus
                    impulsos imorais
Tu controlas teu
                    par
Podes até controlar
                    o país ou o mundo
Mas não teu sono
                    ou teus sonhos

O PRESENTE DA SAUDADE

Tenho saudade das bruxas
                                       não das fogueiras
Tenho saudade dos guerreiros intrépidos
                                       não das guerras
Tenho saudade das putas e dos cabarés
                                       não da gonorréia
Tenho saudade dos sorrisos e das alegrias
                                       não dos motivos
Tenho saudade da companheira
                                       não da namorada
Tenho saudade das orgias
                                       não das ressacas
Tenho saudade das noites e dos dias
                                      não dos meses
Tenho saudade da poesia
                                     não do escrever
Tenho saudade da vida
                                     não da morte
Tenho saudade do último suspiro
                                     aquele que dei agora!

UMA PESQUISA GALOPANTE NOS HI-TECHS DA ARQUEOLOGIA
                                                                                         Valter Di Lascio/Felipe Neto.
O planeta em cheque.
O home no Calvário.
O amor no divã.
A violência em todos nós.
A criatividade na superstição.
O sexo nas estrelas.
Elas no coração.
Nós nos pensamentos.
O pensamento no cheque ao portador.
Ele no Divã.
O amor no Calvário.
A violência na criatividade.
A superstição no sexo.
Nós no coração.
E ao portador, o planeta.